Caracol lembra cerveja gelada, pedaços de pão embebidos no molho aromático, em finais de tarde na esplanada em amena cavaqueira. Nem toda a gente os aprecia, mas quem gosta, gosta mesmo.
Lentamente este petisco começa a entrar nos hábitos das populações do centro do país e até já se encontra em alguns (poucos) estabelecimentos no norte.
Há, sobretudo, alguma repugnância por este animal, de que se conhecem 35 mil espécies e que é um molusco gastrópode que pertence a um grupo que inclui outras espécies marinhas como os bivalves, polvos, chocos e lulas.
Para além disso, possui uma espécie de “pé”, ou músculo ventral, que lhes permite deslizar sobre um rasto de muco, nunca entrando em contacto com quaisquer materiais ou impurezas. Significa isto que o caracol é um bicho bem mais limpo do que, por exemplo, uma galinha ou uma vaca, até porque a sua alimentação é quase exclusivamente feita à base de plantas.
Os nutricionistas não hesitam ao afirmar que a carne de caracol é um dos alimentos mais saudáveis que podem ser consumidos pelo Homem. É pobre em gordura (0,5% a 0,8%) em comparação com a de vaca (11,5%) e galinha (12%) e, para além disso, cada 100 gramas correspondem a apenas 80 calorias.
Em paralelo, o caracol é rico em proteínas (12% a 16%) e sais minerais. E, de acordo com o ministério espanhol da Saúde, nesse conjunto de proteínas está presente a quase totalidade dos aminoácidos necessários ao corpo humano, sendo uma opção de alta qualidade para regimes hipocalóricos, dietas para desportistas, diabéticos e quem sofra de anemia, grávidas e mães a amamentar
O caracol é, desde a Antiguidade, recomendado como remédio para vários tipos de males. Crendices ou não, é certo que os aminoácidos contribuem para a reconstituição da integridade dos tecidos gástricos e, portanto, para a cura de úlceras.
Um absoluto lugar comum relaciona os caracóis com a lentidão. Mas nunca ninguém se tinha lembrado de medir a velocidade que atingem, até um grupo de cientistas – norte-americanos, pois claro – se ter dedicado à tarefa de determinar que a velocidade média de um caracol comum é de um milímetro por segundo.
E já que o assunto é velocidade, importa acrescentar que o caracol foi escolhido como símbolo pelos criadores da “Slow Food”. Este movimento, que pode ser traduzido literalmente por “comida lenta”, foi fundado em Itália em 1986, tem já representações numa centena de países e luta pela protecção dos produtos e receitas de qualidade e tradicionais. Através de várias iniciativas, a associação promove a cultura gastronómica, desenvolve a educação do gosto, conserva a biodiversidade agrícola e protege os alimentos tradicionais do risco de extinção. Afinal, ser lento não é necessariamente uma desvantagem.
Caracóis e “caracoles” No nosso país, as receitas mais tradicionais não dispensam, como já se viu, o tempero dos orégãos e do alho. Já em Espanha, as versões dos “caracoles” mudam de região para região. Se no sul do país vizinho, imperam os molhos com especiarias e tomate, na Catalunha foi criada uma paella à base de carne de coelho e caracóis. E não é difícil encontrar, em plena Andaluzia, um gaspacho gelado com caracóis. Em Logroño, na Galiza, a sopa e o guisado de caracóis são os pratos típicos na Noite de São João, a 24 de Junho. E Em Aragão, o petisco mais procurado são as caracoletas assadas e regadas com um molho de azeite e alho. Atravessando o Mediterrâneo, os caracóis são também consumidos no Norte de África, sendo a cidade marroquina de Marraquexe um dos centros gastronómicos do gastrópode, que é cozinhado com especiarias como açafrão e uma pitada de canela. Os “escargots” franceses
Na Península Ibérica, os caracóis são habitualmente conotados como um prato servido em locais populares. Mas, do outro lado dos Pirinéus, em França, tomam o nome de “escargots” e são uma iguaria servida nos restaurantes mais luxuosos, tendo mesmo sido concebida uma linha específica de talheres para evitar que os comensais usem as mãos
Os “escargots” são parte importante do património gastronómico gaulês, sendo consumidos como entrada ou prato principal. No Natal e na passagem de ano, nunca faltam à mesa dos franceses, sendo essa a época de maior consumo. A forma tradicional de os cozinhar envolve um molho à base de manteiga, alho e salsa
O consumo de caracóis em França ronda a 40 mil toneladas por ano, das quais cerca de metade são importadas de países como Portugal, Espanha e Grécia. A criação de caracóis “Helicicultura” é a designação técnica dada à criação de caracóis e este nome remete para a forma de hélice das conchas. Como é natural, é em França que esta actividade económica se encontra mais desenvolvida, em quintas espalhadas um pouco por todo o país. Além da reprodução pura e simples, os criadores dedicam-se igualmente ao cruzamento de espécies, procurando obter exemplares de dimensão apreciável e, ao mesmo tempo, com o sabor mais desejado. Para isso, tentam obter animais “mestiços” com os genes dos caracóis mais comuns e das caracoletas. Hermafroditas, os caracóis podem acasalar com qualquer outro indivíduo da sua espécie, desde que este se mostre disponível, produzindo uma apreciável quantidade de ovos. Os caracóis podem parecer animais muito vulgares, mas algumas espécies encontram-se ameaçadas de extinção, principalmente devido à acção do Homem e à poluição. Outras existem apenas em cativeiro, reproduzindo-se em jardins zoológicos.
Estes animais variam significativamente de tamanho. A maior espécie terrestre é o Gigante Africano, que pode medir até 30 centímetros, enquanto o campeão dos caracóis aquáticos vive nos mares da Austrália, atingindo 45 centímetros e 20 quilos. A longevidade também é variada, e se grande parte das espécies não atinge os três anos, existem caracóis com 30 anos.
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