quarta-feira

Chegou a época de comer caracóis !





Estão de volta os caracóis!




Todos os anos a fórmula repete-se: chega o calor e as esplanadas enchem-se de fanáticos dos caracóis. 


Um negócio sazonal, alimentado (também) à custa das toneladas que se importam de Marrocos






A época dos caracóis abre mesmo antes de abrir. Depois de um inverno à míngua, assim que surgem os primeiros dias de calor, os clientes habituais começam a perguntar por este petisco nos restaurantes e cafés. Mas só agora eles estão por todo o lado, fazendo-se anunciar com um "Há Caracóis", pespegado nas montras.


Esta é a altura em que a população se divide entre os que não compreendem a euforia em torno destes pequenos animais ("blegh!"), que se sugam com a ajuda de um palito, e os que não perdem uma oportunidade para comê-los enquanto dura a estação.


Cristina Santos Silva, 49 anos, está todo o ano à espera que os caracóis lhe caiam no prato. De maio a agosto, junta-se com as amigas todas as sextas-feiras, para satisfazer esse desejo. Entretanto, vai aproveitando os finais de tarde para continuar a petiscar com a família. Encontramo-la no Boa Esperança, em Benfica, à mesa com o seu filho António Bernardo, de 22 anos. Enquanto falamos, os dois despacham uma travessa (€8) - "há que comê-los quentinhos". E assim que a cunhada Sofia se senta à mesa, mandam logo vir outra.


Esta pequena cervejaria tem bom caracol, diz-se. Há pelo menos 28 anos, desde que Joaquim Gomes pegou no negócio, que assim é. O fornecedor traz-lhe carregamentos da zona de Fátima e, como o armazém fica na Brandoa, pode pedir-lhe mais, consoante a procura, mesmo que seja ao fim de semana. "O nacional é mais pequeno e fininho, mas também mais saboroso. Os clientes estão habituados a estes", nota Joaquim.





De Marrocos, ao preço da chuva


Já se sabe: o nosso está sempre a ser comparado ao de Marrocos, país de onde vem a maioria dos espécimes que se comem em Portugal. Francisco Conde, da Casa dos Caracóis, é um dos maiores responsáveis por importá-los, abastecendo os principais supermercados e restaurantes nacionais (a norte do Mondego ninguém quer saber desta iguaria). Só em 2013 - "um ano espetacular" - comprou cem toneladas por semana. Quando a época acaba, Francisco Conde pega na família e vai passear. O negócio, diz, "dá para vivermos todos, o ano inteiro".


Agora, está prestes a abrir a primeira casa em Lisboa, na Rua de Campolide (tem mais nove na margem sul). Trata-se de uma "superloja, que também tem take away", onde haverá caracóis crus (de €2 a €3,5 o quilo) ou cozinhados (€8,5 a dose). Ele compra-os a menos de um euro por quilo aos marroquinos. Não admira, pois, que em Portugal não haja produção de caracóis (só de caracoletas). Mónica Faria, presidente da única cooperativa agrícola de helicicultores, que apenas investe na caracoleta, explica: "Eles chegam de Marrocos ao preço da chuva. É impossível concorrer com aquele produto."


No entanto, Paulo Fragoso, da Biocaracol, dedica-se a distribuir exemplares nacionais, que são apanhados por várias pessoas nos campos da região de Santarém. E chega a vender cerca de mil quilos por semana, dependendo da qualidade do marroquino. "Esse acaba mais cedo do que o nosso, porque lá faz muito calor. Então, passo a trabalhar com o nacional", explica Vasco Rodrigues, filho do Júlio dos Caracóis, uma instituição na matéria. Neste momento, há 310 lugares na Rua Vale Formoso, perto de Chelas, à espera dos clientes habituais, que já nem questionam o segredo para tanto sucesso. "Só posso dizer que usamos uns produtos que vêm de Espanha", desvenda. De resto, é ele quem lava e coze os gastrópodes, com toda a ciência. O resultado está à vista de quem por lá passe: "A partir das cinco da tarde até às dez da noite é um mundo de gente." Com doses a cinco euros, faça-se as contas...





Petiscar sem culpa


Descansem os adictos de caracóis - desde que não se abuse nas imperiais que normalmente os acompanham, nem se mergulhe o pão no molho, estes petiscos só trazem benefícios nutricionais. Eles são:


  • Ricos em água (70 a 85%)

  • Muito proteicos (13 a 15%)

  • Pobres em lípidos (0,3 a 0,8%), mas com boa quantidade de ácidos gordos polinsaturados

  • Abundantes em sais minerais, sobretudo magnésio, cálcio, ferro, cobre e zinco

  • Dietéticos - 100g de caracóis cozinhados têm menos de 100 calorias




Luísa Oliveira (texto publicado na VISÃO 1107, de 22 de maio)

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